A vacinação infantil contra a Covid-19 já iniciou, nesta sexta-feira (14), para crianças com comorbidades. Muita polêmica e dúvidas vêm sendo lançadas sobre a necessidade da vacinação infantil, uma vez que crianças têm sido o grupo em que menos se verifica casos graves e mortes por Covid-19. Contudo, um menor percentual de internações e mortes não significa risco zero de complicações. O pensamento lógico deveria ser: por que arriscar não vacinar as crianças se há um certo risco, sim, de casos graves e mortes entre os pequenos?
Mas, há quem pense diferente, alegando que os riscos de efeitos adversos causados pela dose pediátrica da vacina da Pfizer seriam maiores. Sem bases científicas ou dados concretos sobre o percentual de efeitos adversos graves em crianças, há pais ou responsáveis que não querem vacinar seus filhos. Para colaborar com as desconfianças, há deputados bolsonaristas que fazem campanha contra a vacinação infantil, a exemplo da deputada federal Bia Kicis. A parlamentar disse, recentemente, que o Estado não pode obrigar a vacinação infantil e que as crianças não são propriedade do Estado. Que os menores de idade pertencem aos pais, sendo eles responsáveis por uma decisão e suas consequências. A deputada ainda diz que se trata de vacina experimental, que não chegou a sua fase quatro de testes esperada para daqui a um ou dois anos. Portanto, a decisão de vacinar implica eventuais riscos de efeitos adversos a longo prazo.
Dose pediátrica segura
Já o ministro Queiroga, apesar de não estimular abertamente a vacinação infantil, tem apresentado um discurso mais brando, dizendo que esta não é uma questão coletiva, ficando a decisão para os pais e que haverá vacinas para todos os que quiserem. Ainda, disse que a vacina infantil é segura, aprovada pela Anvisa e por diversas agências reguladoras de saúde do mundo. Acrescentou que nos EUA já foram vacinadas 8 milhões de crianças sem nenhum registro de efeitos adversos graves.
Desinformação e conceitos equivocados
O discurso da deputada Bia Kicis contém muita desinformação e um raciocínio equivocado. Primeiramente, quando alega que crianças não são propriedade do Estado isso não significa que sejam propriedade dos pais. O menor tem direitos regidos pelo Estatuto da Criança e do Adolescente que preconiza o direito a receber todas as vacinas necessárias a sua faixa etária. Assim, não se pode dizer que crianças pertencem aos pais como se estes tivessem o direito de fazer o que bem entendem com elas. Nossa legislação, por exemplo, não permite diversas práticas abusivas e até violentas contra o menor, a exemplo de agressões físicas, maus tratos, abuso sexual ou, mesmo, a tal da palmada educativa. Dizer, por exemplo, que “o filho é meu e eu bato nele quando quiser”, não é algo aceitável dentro da sociedade brasileira atual. Temos um Estado Democrático de Direito que garante também direitos e proteção a integridade e bem-estar do menor. Isso não significa que a criança seja propriedade do Estado mas que este tem o dever de protegê-la em seus direitos quando necessário. Infelizmente, a parlamentar dissemina confusão de conceitos usando, desta vez, a vacinação infantil para defender bandeiras ideológicas que colocam o indivíduo e suas liberdades individuais acima de tudo, gerando um falso antagonismo entre Estado e liberdades individuais. Ora, toda liberdade individual tem limites. Se violar direitos dos demais deve ser limitada. O fato de menores estarem legalmente sob a responsabilidade dos pais não lhes dá direitos absolutos sobre seus filhos. Lembrando que a perda da guarda dos filhos é um expediente utilizado em situações diversas. Então, dentro de uma discussão de conceitos, há ideias distorcidas sendo propagadas por bolsonaristas.
Dentro de um debate mais prático e objetivo sobre a vacinação, a posição do ministro Queiroga é a mais sensata, deixando aos pais a decisão, mas, sem desestimular a vacinação, buscando esclarecer que a dose infantil é segura, aprovada por diversas agências de saúde. Comenta-se que o núcleo duro do bolsonarismo, aliás, não tem gostado nem um pouco de algumas declarações do ministro, a exemplo de sua afirmação de que a vacina infantil é segura e de que a maioria das internações hospitalares, principalmente, em UTIs, são de não-vacinados. Vale lembrar que o ministro é médico cardiologista e deve se encontrar numa saia-justa, buscando falar como médico e como político ao mesmo tempo. Teme desagradar ao presidente da República, mas, também, não quer disseminar desinformação e distorções científicas para não destruir sua reputação como médico.
Bolsonarismo-raiz
O interessante é verificar as reações dos antivacinas a respeito da postura de Queiroga. Preferem dar crédito a discursos do Bolsonaro e seus deputados, que não são médicos, nem cientistas, a acreditar em um ministro da Saúde que é médico. Muitos bolsonaristas-raiz vivem indignados com o ministro, nas redes sociais. Alguns chegam a dizer que ele seria pior que o Pazuello.