terça-feira, 21 de maio de 2024
Vitória de Milei, na Argentina, impõe desafios nas relações com o Brasil

Vanessa Martins de Souza

Jornalista responsável dos jornais do Grupo Paraná Comunicação (A Gazeta Cidade de Pinhais, A Gazeta Região Metropolitana, Agenda Local e Jardim das Américas Notícias)

Vitória de Milei, na Argentina, impõe desafios nas relações com o Brasil

A vitória do candidato de extrema-direita na Argentina, Javier Milei, promete relações difíceis com o Brasil, devido a posicionamentos político-ideológicos antagônicos com o presidente Lula e a esquerda brasileira. Em campanha, Milei chegou a chamar o presidente Lula de “comunista corrupto”. Muitos brasileiros, naturalmente, concordam com o presidente eleito argentino e o aplaudem. Contudo, o ponto em questão não é esse. A questão é o que isso revela sobre o novo presidente argentino: sua falta de tato e pouco diálogo. Resta saber se, finda a campanha, bastante populista, por sinal, terá condições de continuar “falando grosso” com quem desejar e ainda assim conquistar governabilidade e manter o apoio popular.

Parcerias com o Brasil

O presidente Lula foi diplomático, ”pero no mucho”, após as eleições argentinas. Limitou-se a parabenizar o povo argentino e o processo democrático pelas redes sociais, desejando boa sorte e colocando o Brasil à disposição para parcerias. O nome de Javier Milei não foi citado. A Secretaria de Comunicação Social posicionou-se a favor de que Lula fale com Milei somente após um pedido de desculpas deste. Obviamente, Lula não vai a posse do auto-intitulado “libertário” e “anarcocapitalista” argentino. O Brasil deverá enviar um representante.

Bolsonarismo surfa na onda

Já o ex-presidente Bolsonaro, foi convidado para a posse. Conversou por videochamada com o presidente eleito argentino. E, claro, não poderia faltar o bolsonarismo surfando na onda da vitória de Milei, que acaba de derrotar o peronista Sérgio Massa.

“Maluco“ de extrema-direita

É compreensível que os argentinos tenham eleito um candidato de extrema-direita, considerando-se o caos em que se encontra a Argentina. O país enfrenta sua maior crise nos últimos trinta anos, com uma inflação de 142% e 40% da população abaixo da linha da pobreza. O candidato peronista também era muito ruim. Logo, melhor apostar numa “novidade” de alto risco a permanecer com a esquerda que, praticamente, quebrou a economia argentina.

Exemplo do governo Bolsonaro

O que não é compreensível são os bolsonaristas comemorarem, uma vez que já tivemos uma experiência complicada, aqui, no governo Bolsonaro, que encontrou imensa dificuldade em obter governabilidade. Se não fosse o “orçamento secreto”, Bolsonaro não teria terminado o mandato. O que se comenta na imprensa é o desafio de Milei para obter maioria no parlamento. Por enquanto, o argentino não conta com a maioria, nem na Câmara, nem no Senado. O apoio que recebeu do ex-presidente moderado de direita Maurício Macri e da candidata Patrícia, a terceira colocada, serão decisivos para obtenção de uma base aliada maior no Poder Legislativo.

Dolarização e fechamento do Banco Central

Promessas de dolarização da economia e de fechamento do Banco Central serão impraticáveis. A Argentina não tem reserva de dólares suficientes para a dolarização. Dependerá da boa-vontade dos Estados Unidos, uma utopia com o democrata Joe Biden. Talvez, nem Trump se importaria em ajudar a Argentina…

Mudança de discurso

A certeza é que Milei terá de recuar em suas propostas mais radicais se quiser aprovação do parlamento. Da mesma forma que Bolsonaro teve de ceder. Tanto que no segundo turno, Milei abrandou o discurso. E após eleito, já avisou que fechar o Banco Central não será a curto prazo. Milei seria tão “maluco” quanto aparenta ou bastante esperto e oportunista?

Assim como tem recuado em propostas extremistas no segundo turno, possivelmente, deverá recuar em relação ao Brasil, com quem queria cortar relações no primeiro turno, assim como com a China. Depois, no segundo turno, disse que não seria bem assim. O Brasil tem a Argentina como seu terceiro maior parceiro comercial, depois da China e dos EUA. No ano passado, as exportações alcançaram 13 bilhões de dólares para a Argentina. Milei terá de nomear um embaixador muito habilidoso no Brasil. Da mesma forma que foi feito quando Bolsonaro era presidente e quem estava no poder na Argentina era o esquerdista Alberto Fernandez, com ambos não nutrindo boas relações entre si.

Ironia e provocações de Lula

O presidente Lula, por sua vez, ainda não curou a mágoa com Milei. Na terça-feira (21/11) alfinetou, ironizando, o presidente eleito argentino em sua tradicional live nas redes sociais. Disse que o ministro Haddad deve conversar com quem pensa diferente sobre Economia, mas, que não queira saber da nova experiência que querem implantar no continente. Mas, aparentemente, o perfil de Lula é muito mais político do que o de Milei.

Esforços da diplomacia

Os esforços maiores terão de vir da Argentina, possivelmente, de um bom embaixador. Um presidente que não fala com os pais há anos, dizendo que estariam mortos para ele, devido a maus tratos na infância, terá de aprender a conversar com quem não gosta ao governar a Argentina. Do contrário, talvez, terá de enfrentar a passionalidade histórica dos hermanos, que costumam ir para as ruas protestar com muito mais facilidade que os brasileiros. E possivelmente não alcancem o nível de idolatria a um candidato de direita que o Brasil vivenciou com Bolsonaro, que ganhou o apelido de “mito”. Na Argentina, a idolatria sempre foi ao peronismo. A expectativa é de que Milei consiga fazer um governo, ao menos, um pouco melhor que o de seu antecessor e que se revele um presidente com alguma sensatez e habilidade política. Que o populismo radical tenha sido mera estratégia de marketing, conforme foi se revelando no segundo turno.

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