terça-feira, 21 de maio de 2024
Ministro Alexandre de Moraes parece querer deter o monopólio das “verdades inteligentes”

Vanessa Martins de Souza

Jornalista responsável dos jornais do Grupo Paraná Comunicação (A Gazeta Cidade de Pinhais, A Gazeta Região Metropolitana, Agenda Local e Jardim das Américas Notícias)

Ministro Alexandre de Moraes parece querer deter o monopólio das “verdades inteligentes”

O ministro do STF, Alexandre de Moraes, fez uma declaração polêmica durante Congresso de Magistrados, na Bahia, no final de semana passado. Em discurso, disse que a internet “deu voz a imbecis”, em referência a supostas milícias digitais bolsonaristas a propagar “fake news” na internet.

Apesar do contexto específico em que se referiu a “imbecis”, muitos internautas sentiram-se ofendidos e indignados com a avaliação do magistrado sobre o comportamento dos internautas. Inclusive, porque Moraes foi além e continuou seu discurso referindo-se a pessoas que supostamente deteriam algum saber e aparecem como “professores” nas plataformas digitais, bastando a presença de uma biblioteca no cenário para passar credibilidade. Sem citar nomes, a fala do ministro possivelmente deve ter ofendido a muitos professores e educadores, em geral, que possuem perfis nas redes sociais, em plataformas como o YouTube. Enfim, no mínimo, soou por demais arrogante tachar de “imbecis” a voz de tantos que atuam nas redes sociais.

Perseguição a bolsonaristas

É evidente que o ministro quis atingir canais e perfis bolsonaristas, visto que não é novidade para ninguém as constantes desavenças entre Moraes, Bolsonaro e lideranças bolsonaristas. Porém, se há supostas vozes imbecis na internet, a quem caberia estabelecer um juízo de valor sobre o que é inteligente ou não nas redes sociais? Seria de bom tom um ministro do STF, um magistrado, um juiz, emitir opinião publicamente sobre questões políticas e sobre quê tipo de conteúdo os internautas devem dar voz? Creio que juízes que honram o cargo público que ocupam devem adotar uma postura discreta e bastante imparcial, sem proferir opiniões pessoais sobre política, comportamento ou outros temas.

É lamentável ver, a cada dia, alguns ministros, como Moraes, mais e mais despudorados em expressar posturas e discursos próprios de militantes políticos. O ministro não é obrigado a apoiar o bolsonarismo, mas, na posição de juiz, deveria colocar-se neutro, publicamente. Também, é de causar indignação a tentativa de estabelecer, de forma arbitrária e pessoal, o que é imbecil e o que não é. Desconfio que o ministro deva julgar inteligente apenas as vozes que concordam com ele ou com políticos e partidos de sua preferência. Enfim, quais os critérios para estabelecer o que seria “imbecil” e o que seria “inteligente” para postar na internet?

Pluralidade de ideias

Em não se tratando de ciências exatas, onde não há discussão sobre verdades, todo o restante no debate público pode ser passível de controvérsias, opiniões contrárias, dúvidas e pontos de vista diferenciados. Isso é pluralidade de ideias. Isso é debate. Não há debate sem pluralidade de ideias. E sem pluralidade de ideias, não há democracia. Assim, torna-se bastante arbitrário definir o que é inteligente sob a óptica de uma única pessoa, de um ponto de vista absolutamente subjetivo.

Ato falho

Talvez, o ministro tenha cometido um ato falho e, no fundo, queria defender, mesmo, a ausência de debates na internet. Uma vez que acredita que “imbecis” não devem ter voz na internet. Então, quer dizer que “imbecis” não teriam direito a expressar-se nas redes sociais? Democracia deveria ser exercida apenas por inteligentes? Mas, democracia é para todos ou não é para ninguém, eis, a essência da democracia. E quem deveria determinar o que é imbecilidade? Vejamos como um discurso público pode ensejar um destrinchar de implicações bastante sérias e perigosas…

Sem o contraditório

Além da arrogância com que proferiu tais opiniões, Moraes fez, nas entrelinhas, possivelmente, uma confissão. A de que não quer divergências de opiniões e de interpretações de fatos se estes não forem condizentes ao que ele e o STF, o TSE, determinem como “corretos” e “verdadeiros”. E pensar que o ministro estará presidindo o TSE a partir de setembro, sendo a principal autoridade da Justiça Eleitoral durante as próximas eleições presidenciais… Diante da iminência de assumir responsabilidade tão importante durante o pleito, faria-lhe bem, mais sobriedade e neutralidade quanto ao que pensa sobre política.

Ditadura do pensamento único

Por um lado, o ministro até pode ter razão. Sempre há imbecilidades e fake news propagadas na internet. Mas, ainda, assim, é melhor dar voz aos imbecis, também, a restringir e reprimir as vozes do povo. O problema não é a internet, nem a voz dos imbecis, o problema é querer calar o povo, dando voz, apenas, a tantos imbecis em cargos públicos ou na imprensa. Democracia também serve para democratizar a imbecilidade, responderia ao ministro com ironia.Dos males, o menor. Como diz uma famosa citação atribuída ao filósofo Voltaire: ”posso não concordar com nenhuma palavra que você disser, mas, defenderei até a morte o seu direito de dize-la”.Do contrário, estaremos entrando num caminho perigoso para a sociedade, onde uma ditadura do pensamento único e de “verdades inquestionáveis” dominarão o “debate” público. Infelizmente, parece que a “caça às bruxas” está só começando…

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