segunda-feira, 6 de maio de 2024
Conta da pandemia deverá ficar para prefeitos e governadores, já que aprovação de Bolsonaro cresce

Vanessa Martins de Souza

Jornalista responsável dos jornais do Grupo Paraná Comunicação (A Gazeta Cidade de Pinhais, A Gazeta Região Metropolitana, Agenda Local e Jardim das Américas Notícias)

Conta da pandemia deverá ficar para prefeitos e governadores, já que aprovação de Bolsonaro cresce

A notícia surpreendente da sexta-feira (14/08) foi a pesquisa do Instituto Datafolha que aponta o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) alcançando a melhor avaliação de seu mandato. Depois de uma significativa perda de popularidade após a saída do então Ministro Sérgio Moro, no final de abril, e de algumas declarações polêmicas em relação à pandemia, Bolsonaro recupera sua aprovação, passando de 32% para 37% o número de entrevistados que consideram seu governo ‘bom’ ou ‘ótimo’. Chama mais atenção, ainda, o percentual dos que consideram a gestão ‘ruim’ ou ‘péssima’, que diminuiu em 10%, de 44% para 34%, patamar semelhante ao do início do mandato, considerando a margem de erro de dois pontos percentuais. Entre os que avaliam a gestão como ‘regular’, o percentual também subiu de 23% em junho para 27%. O Instituto ouviu 2.065 pessoas nos dias 11 e 12 de agosto, por telefone. De fato, são muito poucas pessoas ouvidas pelo levantamento e ainda não é possível avaliar se essa alta na popularidade se revela uma tendência ou trata-se apenas de um momento pontual.

Conta da pandemia a prefeitos e governadores

Contudo, se realmente a pesquisa reflete um quadro bastante próximo da realidade, convém analisar alguns fatores que influenciaram esses novos números e os riscos que estes ensejam a longo prazo. Mesmo somando já mais de 105 mil mortes por Covid-19 no país, ao que tudo indica, uma parcela expressiva da população não tem considerado o presidente da República o principal responsável por tantas perdas em vidas. Muito provavelmente, a conta deve estar caindo para a gestão dos governadores e prefeitos, uma vez que as decisões relativas ao SUS seguem orientações bastante locais no tocante à pandemia. Cada município tem adotado orientações e protocolos diferentes, conforme as decisões de cada gestão municipal. E, também, as decisões relativas ao comércio, sobre as quais cada prefeito tem total autonomia. Os casos de corrupção e superfaturamento com recursos federais enviados para a pandemia aos estados e municípios também devem ter contribuído para que a avaliação da população seja muito mais negativa em relação a prefeitos e governadores que ao presidente da República.

Auxílio emergencial aumenta popularidade

Outro fator muito preponderante, esse de forma muito mais marcante, é a concessão do auxílio emergencial. Prorrogado para cinco meses , o “corona voucher”, destinado a trabalhadores informais, desempregados e beneficiários do Bolsa Família, chegou a contemplar metade das famílias brasileiras em junho, segundo o IBGE. De acordo com o Datafolha, entre os que receberam essa ajuda financeira, 42% consideram o governo ‘ótimo’ ou ‘bom’, acima da média geral, enquanto entre os que não recorreram ao auxílio, a aprovação é de 36%. O auxílio emergencial surtiu um grande efeito positivo na imagem do governo e do presidente Bolsonaro, principalmente, no Nordeste, tradicional reduto do PT e do antigo Bolsa Família. Nessa região, 45% da população recorreu ao “corona voucher”, um percentual acima dos 40% no restante do país. Pois bem. Justamente nessa região do país, a rejeição a Bolsonaro caiu de forma mais significativa, de 52% para 35%. Ou seja, é evidente que o auxílio emergencial foi o grande fator a melhorar a imagem do mandatário do Palácio do Planalto entre os nordestinos mais pobres.

Classe média pagará a conta

E é precisamente nessa questão que está o perigo. Quando acabar o auxílio emergencial, como o governo irá sustentar essa aprovação entre as populações mais carentes que recorrem a esse dinheiro? Não à toa, já se comenta a possibilidade de prorrogação da ajuda financeira até dezembro ou, talvez, até março de 2021. O problema é que “não existe almoço grátis”, lembra-nos o bordão dos liberais. Não há dinheiro para tanto, em meio a uma crise econômica, a não ser que se extrapole o teto de gastos. O que desagradará a equipe de Paulo Guedes, que já sofreu algumas baixas durante a semana, aliás, com a justificativa de o governo estar demorando muito para fazer algumas privatizações importantes. A ala liberal do governo, enfim, poderá ficar muito insatisfeita com os rumos das políticas públicas se os gastos da máquina com programas sociais forem mantidos por tanto tempo.

Reforma tributária penaliza até livros

Como dinheiro não é multiplicado em um passe de mágica – a não ser que se imprima mais papel-moeda, gerando inflação – alguém terá de pagar a conta do auxílio emergencial. A equipe do Ministro da Economia já prepara aumento nos tributos. Uma hipótese é a criação de uma nova espécie de CPMF. Fala-se, até, em taxação de livros. Entre os itens da proposta de reforma tributária de Paulo Guedes encaminhada ao Congresso, está o retorno da contribuição tributária em cima dos livros. O que será um “golpe fatal” para o mercado editorial, já combalido pela perda de 20% de seu faturamento entre 2006 e 2018, tendo resultado em diversas livrarias pedindo falência nos últimos anos. No Brasil, desde a Constituição Federal de 1946, o produto é isento de impostos por causa de uma emenda constitucional apresentada pelo autor brasileiro de maior prestígio internacional à época, Jorge Amado. A CF de 1988 manteve o dispositivo como uma forma de incentivar a difusão de conhecimento literário. No entanto, a emenda não contempla os tributos de contribuição como o PIS e o Cofins. Mas, em 2004, o mercado foi desonerado do pagamento desses dois tributos. Pela nova proposta do Governo Federal, esses tributos seriam substituídos pela Contribuição Social sobre Operações com Bens e Serviços (CBS), com alíquota de 12%, o que deverá encarecer ainda mais os preços dos livros. Guedes disse que livros são produtos “da elite”, e quem costuma comprá-los poderá pagar um valor mais caro. Já aos que não podem comprá-los, o governo doará livros, defendeu o ministro.

“Pão e circo”

Lamentavelmente, se as coisas continuarem por esse caminho, a política econômica do Governo Federal deverá se resumir ao antigo “pão e circo” para o povão. E “couro no lombo” da classe média. Espero que o Governo Federal acorde para a realidade de que sustentar a economia com bolsas e auxílios, enquanto taxa-se com mais tributos a classe média, não é o caminho certo. Já vimos esse filme bem ruim e sabemos como termina. Ainda dá tempo de rever os rumos e apresentar um projeto de retomada econômica de verdade, que não se ancore em aumento da carga tributária. O brasileiro já está farto de carregar nas costas uma máquina federal pesada com o suor de seu trabalho.

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