domingo, 19 de maio de 2024
Caso Senador Chico Rodrigues torna público absurdo da permissão de indicação de parentes em chapas ao Senado

Vanessa Martins de Souza

Jornalista responsável dos jornais do Grupo Paraná Comunicação (A Gazeta Cidade de Pinhais, A Gazeta Região Metropolitana, Agenda Local e Jardim das Américas Notícias)

Caso Senador Chico Rodrigues torna público absurdo da permissão de indicação de parentes em chapas ao Senado

O caso do Senador Chico Rodrigues (DEM-RR), vice-líder do governo Bolsonaro no Senado, como se não bastasse o mau gosto grotesco de ter sido flagrado pela Polícia Federal com dinheiro escondido até na cueca, ainda trouxe mais um motivo para um sentimento de repulsa a tudo que o envolve. Em razão da determinação de afastamento do cargo pelo ministro do STF, Luís Roberto Barroso, veio a público que seu suplente nada mais é que seu próprio filho, Pedro Arthur Rodrigues. Ou seja, tudo ficaria como sempre, em família.

Filho suplente também é suspeito

Aliás, o filho suplente também é considerado suspeito de envolvimento nos esquemas de corrupção do pai. Nas diligências de busca e apreensão em endereços do senador Chico Rodrigues, a Polícia Federal descobriu que a empresa de engenharia do filho dele, Pedro Arthur Rodrigues, funciona no mesmo lugar que seu escritório político. Segundo os policiais, a empresa San Sebastian fica no mesmo endereço que o escritório usado por Chico Rodrigues, em Boa Vista, como “base de apoio” para candidaturas municipais. Nos computadores do local, a PF verificou que há várias pastas com documentação dos respectivos candidatos, bem como a lista daqueles que concorrerão pelo partido. A PF entregou relatório ao ministro Barroso. De acordo com o relatório, a sede da empresa San Sebastian funciona no local da busca.

Desvio de verbas para a saúde

O senador vem sendo investigado por desvios de verbas de emendas parlamentares destinadas ao enfrentamento da Covid-19 em seu estado, Roraima. É suspeito de ser chefe de um grupo criminoso que desvia verbas da Secretaria de Estado da Saúde. Depois que o escândalo veio à tona, gerando uma infinidade de memes na internet, por conta da cena grotesca diante da PF, o Presidente Bolsonaro destituiu o senador da vice-liderança do governo. O ministro Luís Roberto Barroso, por sua vez, suspendeu a determinação de afastamento do cargo de senador após Rodrigues pedir licença de 120 dias. Em licenças maiores que 120 dias, a legislação prevê que o suplente deve assumir o cargo.

Elegibilidade de parentes em chapas ao Senado

O fato inconteste é que mais um absurdo de nosso sistema político foi revelado a partir desse caso. Nas eleições para o Senado, vota-se não somente no candidato, mas, na chapa, que conta com os nomes do primeiro e segundo suplentes. O eleitor, em sua imensa maioria, sequer, se dá conta de que, ao votar em um candidato a senador, está votando, juntamente, na chapa, em dois suplentes, designados para eventuais substituições. A excrescência do nosso sistema político, da nossa legislação, é a possibilidade de se incluir familiares na chapa para o Senado, abrindo espaço para que filhos, netos, ou quaisquer parentes, possam substituir o senador eleito como suplentes.

PEC 37/11, em 2011, não vingou

Aliás, as regras de suplência de um senador já foram debatidas por ocasião de reforma política em discussão no Senado, anos atrás. Mas, não evoluíram na tramitação. Em 2011, houve a Proposta de Emenda à Constituição – PEC 37/11, prevendo diversas mudanças, como a redução do número de suplentes, de dois para um, e a definição de caráter temporário para a substituição. De acordo com a legislação em vigor, as eleições para o Senado são feitas pelo sistema majoritário de maioria relativa, ou seja, sem necessidade de segundo turno para a proclamação do vencedor ou vencedores. As eleições para senador ocorrem de quatro em quatro anos, sendo a renovação feita em um terço das cadeiras em um pleito e em dois terços no pleito seguinte. O eleitor vota numa chapa com um titular e dois suplentes, que são como “vice-senadores”, pois, exercem o mandato em caso de afastamento do titular. O suplente também assume o mandato nos casos de renúncia, morte ou cassação do titular. É prevista a substituição, ainda, quando o titular se licencia por mais de 120 dias. Se o cargo de senador ficar vago e não houver suplente, a Constituição Federal determina a realização de eleição para preencher o posto, se faltarem mais de 15 meses para o término do mandato.

Proibição de eleição de suplentes parentes do titular da chapa

A referida PEC chegou a ser aprovada na comissão especial e na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado. A proposta alterava os artigos 46 e 56 da Constituição, reduzindo de dois para um o número de suplentes de senador. A PEC também proibia a eleição de suplente que fosse cônjuge, parente consanguíneo ou afim, até o segundo grau ou por adoção do titular da chapa. Além disso, de acordo com a PEC, a convocação do suplente passaria a ter caráter temporário. Quando ocorresse o afastamento definitivo do titular, seu suplente exerceria o cargo somente até a posse de novo senador, que seria eleito conforme algumas regras propostas. Os parlamentares que assinaram a PEC reconheceram que havia pouca transparência tanto no processo de escolha como na divulgação das candidaturas dos suplentes. Eles também consideraram que a determinação de que fosse realizada nova eleição em caso de abertura de vaga de senador aumentaria a legitimidade do exercício do mandato.

Suplentes candidatos não-eleitos, por ordem de votação

O Senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), anunciou, à época, que pretendia apresentar emenda à PEC, baseada no teor de um projeto de lei de sua autoria (PLS 41/11). A sugestão de Eunício seria estabelecer que os suplentes de senadores fossem os candidatos não eleitos para o cargo, em número de dois para cada titular, segundo a ordem da votação recebida. De forma semelhante ao que acontece nas demais casas legislativas, por eleições proporcionais, a exemplo das câmaras de vereadores, da Câmara dos Deputados e das assembleias legislativas nos estados.

Pressão popular por reforma política

Lamentavelmente, essas propostas de mudanças na legislação não vingaram até hoje. O que é incompreensível, uma discrepância, afinal, vereadores, por exemplo, sequer podem contratar parentes em seus gabinetes, de acordo com a legislação. Há farta legislação também tratando de diversos casos em que prevalece a “inelegibilidade por parentesco”, principalmente para cargos ao Poder Executivo.Por que, então, candidatos a senador contam com esse privilégio de poder incluir parentes na própria chapa? Uma nova reforma política já devia estar acontecendo “para ontem”, pois, até o momento, nunca se fez um reforma política decente, correspondendo integralmente aos anseios da sociedade. Muitos absurdos e injustiças em nosso sistema político só serão corrigidos com uma ampla reforma política. Contudo, uma reforma desse porte depende da vontade política dos próprios congressistas. Acredito que, sem grande pressão da sociedade, do eleitorado, jamais esta se concretizará. Quê parlamento no Brasil empenha-se em votar contra seus próprios privilégios, afinal?

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