terça-feira, 14 de maio de 2024
Campanha contra passaporte sanitário é baseada em mentiras e disputa ideológica

Vanessa Martins de Souza

Jornalista responsável dos jornais do Grupo Paraná Comunicação (A Gazeta Cidade de Pinhais, A Gazeta Região Metropolitana, Agenda Local e Jardim das Américas Notícias)

Campanha contra passaporte sanitário é baseada em mentiras e disputa ideológica

O ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, voltou a causar polêmica ao declarar que o Brasil não deverá adotar a exigência de passaporte sanitário a estrangeiros que chegarem ao país. E ainda endossou “argumentação” passada do presidente Bolsonaro sobre a importância da defesa das liberdades individuais acima de tudo com uma frase impactante, porém, bastante passível de argumentações . Disse o ministro que “às vezes, é melhor perder a vida do que a liberdade”.

A declaração, naturalmente, enseja uma série de argumentações contrárias. Afinal, de que vale a liberdade quando se trata de pôr em risco a própria saúde ou a vida? Um doente de Covid-19 encontraria alguma liberdade enquanto doente? E um morto por Covid-19, quê liberdade encontraria? Apesar de carecer de sentido, o argumento do ministro encontra uma quantidade preocupante de simpatizantes entre apoiadores do presidente da República, o que pode ser verificado em comentários de populares nas redes sociais. Alguns jornalistas da direita conservadora, também, abraçam a “causa”, implantando inclusive uma verdadeira cruzada contra a adoção do passaporte vacinal. Fala-se, até, em “apartheid social“ a partir da obrigatoriedade do passaporte . Não-vacinados contra a Covid-19 estariam sendo “discriminados socialmente”, sendo impedidos de frequentar restaurantes, bares, eventos, e até estabelecimentos comerciais. Alega-se, ainda, que o passaporte vacinal não conta com nenhum respaldo científico, constituindo-se, apenas, em uma forma de controle social dos governos sobre a população.

Protestos contra passaporte sanitário

Tais opositores tem feito uma série de protestos contra o passaporte vacinal, principalmente, na Europa. No Brasil, em algumas localidades, também, já há protestos populares com o mesmo objetivo. Entre os motes da campanha contra o passaporte está o “argumento” de que vacinados transmitem o vírus igualmente, logo, não faria sentido exigir que se tome as doses necessárias da vacina a fim de evitar uma possível transmissão. Também questionam a eficácia das vacinas com a seguinte colocação: ”se quem tomou a vacina tem medo de esbarrar em um não-vacinado infectado é porque não acredita que está protegido com o imunizante”.

Falácias repetidas a exaustão

Tais “argumentos” podem parecer convincentes num primeiro momento, a quem não está muito bem informado sobre como funcionam as vacinas. Mas, um raciocínio mais apurado e informações mais precisas fazem cair por terra essas argumentações falaciosas. Primeiramente, é preciso lembrar que não há nenhuma vacina que garanta 100% de eficácia contra a infecção por Covid-19. O que as vacinas costumam gerar é um percentual alto de proteção contra formas graves de Covid-19. Mesmo assim, essa proteção contra formas graves não é de 100%. Então, haverá pessoas que, mesmo imunizadas com duas, três doses, terminarão por contrair Covid-19 desenvolvendo a forma grave. Outra falácia que tem sido amplamente repetida pelos anti-passaporte vacinal é a falsa ideia de que vacinados transmitem o vírus, igualmente. Não, vacinados não transmitem o vírus igualmente. Já há estudos divulgados, meses atrás, dando conta de que vacinados transmitem uma menor carga viral e por menos tempo. Por estarem com o sistema imunológico contra a Covid-19 funcionando bem, o organismo consegue eliminar o patógeno com mais rapidez que um não-vacinado. Um estudo feito no Reino Unido demonstrou esse dado. O estudo foi feito entre residentes de uma mesma casa, onde havia vacinados e não-vacinados, pontuou a vice-presidente do Sabin Vaccine Institute, Denise Garrett, em reportagem publicada na grande imprensa em setembro passado. Quem tiver dúvidas, basta dar um “Google” e verificar todos os estudos já realizados apontando para uma menor transmissão entre vacinados em relação a não-vacinados. De maneira vergonhosa, os anti-passaporte sanitário têm repetido mentiras a respeito da transmissão entre vacinados. Triste verificar que até jornalistas que haviam construído um certo “nome” na profissão estejam repetindo essa falácia de que vacinados transmitem igualmente.

Movimento sem bases científicas

Então, todo cuidado é pouco quanto a dar crédito a esse movimento contra o passaporte com base em mentiras repetidas incansavelmente, mas, sem respaldo científico. O mais curioso é que eles acusam a defesa do passaporte como algo sem base científica quando quem está fazendo isso são eles. Quando se trata de doenças virais, é muito importante atentar para a carga viral recebida pelo infectado. Quanto maior a carga viral recebida, maior a probabilidade de o sistema imunológico não conseguir combater o vírus. Por que vimos tantos médicos e enfermeiros jovens e saudáveis falecerem de Covid-19 ou desenvolverem formas graves da doença? Por que estes profissionais receberam altas cargas virais por motivos óbvios: estiveram na linha de frente de combate a doença, tendo entrado em contato com diversos pacientes infectados, repetidas vezes.

Preocupação com a coletividade

É muito preocupante que um número considerável de pessoas esteja se posicionando contra o passaporte sem buscar informações de credibilidade, com bases científicas. Muitos duvidam da ciência, da indústria farmacêutica, da grande imprensa, mas, sequer, desconfiam de determinados políticos ou lideranças. Realmente, não dá pra entender onde está a lógica e o bom senso dessas pessoas… A única explicação é a necessidade de politizar tudo, até, a simples adoção de um passaporte sanitário feito para proteger a saúde da coletividade. Para essas pessoas, falar em coletividade é uma heresia… A associação ao “comunismo” e a “governos totalitários” logo vem a mente deles. Como se fosse possível a alguém viver em sociedade, no dito mundo civilizado, sem pensar na coletividade. Liberdades individuais, todos, em sã consciência, claro, desejam. Contudo, desde que essa liberdade não fira o direito do outro. Posso sair dirigindo bêbado por aí? Posso desrespeitar leis e sinais de trânsito? Posso fumar em qualquer ambiente público e fechado? Não, claro, pois, tratam-se de posturas que afetam o outro. No caso, o direito a preservação da saúde e a vida do outro, até, estão em jogo. Não há liberdade individual absoluta em nenhuma sociedade. Quem se utiliza desse tipo de argumentação para se posicionar contra o passaporte está entrando num delírio coletivo, numa utopia onde o indivíduo prevalece em absoluto sobre o coletivo. Mas, esse modelo é inviável quando se vive em sociedade, onde há interdependência entre os indivíduos. E em se tratando de pandemia, de doenças transmissíveis coletivamente, então, esse tipo de defesa torna-se um escárnio.

Controle social

Nunca houve na história da humanidade uma sociedade sem regras e limites de comportamento, pois, são tais características que fazem- na constituir-se em uma sociedade civilizada. Do contrário, seria a barbárie. E quanto ao medo de “controle social“, de “governos totalitários”, e outras paranoias, existem formas mais sutis de controlar indivíduos, a exemplo das redes sociais, do pagamento de tributos e pedágios, da mídia, da publicidade, das propagandas políticas, das ideologias, das religiões, das listas do Serasa, dos bancos e instituições financeiras, das câmeras de segurança por toda parte… Creio que passaporte sanitário não é necessário para isso.

publicidade

Compartilhe:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

plugins premium WordPress