A decisão do ministro do STF, Edson Fachin, de anular as condenações do ex-presidente Lula, por supostos vícios processuais, deu a largada para a corrida presidencial de 2022. Com a decisão, Lula não foi declarado inocente, mas, deixou de ser inelegível, podendo disputar a Presidência da República em 2022.Tanto que não perdeu tempo e foi a mídia discursar longamente, tendo sido aclamado pela militância, obviamente. Mas, uma militância que há anos têm dado sinais de franco enfraquecimento. Seu eleitorado cativo também tem diminuído, bem como de todo o PT. A boa votação de Haddad no segundo turno das eleições presidenciais de 2018 se deu, em grande parte, pelo alto índice de rejeição ao candidato Bolsonaro, a época. Ou seja, foi mais um ‘não’ a Bolsonaro do que propriamente um ‘sim’ ao chamado “poste” e ao PT. Aliás, uma condição não muito diferente da obtida pelo então candidato Bolsonaro, que só venceu as eleições por causa da grande rejeição ao PT por outra parcela significativa do eleitorado.
Lula, aproveitando-se da oportunidade de crise gravíssima no país em função da pandemia, fez o mesmo discurso de sempre, com ares de pretenso estadista, defendeu o fortalecimento das estatais, a vacinação em massa, entre outras bandeiras mais do que conhecidas do PT. E não abandonou o discurso vitimista de “injustiçado” e “perseguido”, alegando inocência, como sempre. Os simpatizantes do petista endossam a narrativa dizendo que não há provas contra ele e que Moro foi um juiz parcial.Cinicamente, não consideram provas as fotografias, por exemplo, das instalações do sítio de Atibaia, onde até um quadro com a imagem de Lula na parede há. Desconsideram imagens de Lula conversando com empreiteiros a porta do triplex do Guarujá. O fato de Lula ter pago impostos do triplex até 2015. Fachin não declarou a inocência de Lula, vale repetir. Os processos voltam ao início na Justiça Federal de Brasília, um entendimento bastante controverso, aliás, a suposta falta de competência da Vara de Curitiba para julgar tais matérias. Tanto que a PGR já entrou com recurso junto ao STF pedindo para manter as condenações do caso do triplex e do sítio, deixando as ações do Instituto Lula, ainda não sentenciadas, para a Justiça Federal de Brasília.Cabe ao ministro Fux, presidente do STF, deliberar sobre uma data para o julgamento deste recurso.
Mas, voltando a questão eleitoral, o que significaria uma possível condição de Lula novamente apto a candidatar-se eleitoralmente? Que ele representaria uma ameaça a reeleição de Bolsonaro? A direita, com certeza, teme essa possibilidade. E ao que tudo indica, o próprio Bolsonaro. No dia seguinte, o presidente da República já começou uma guinada surpreendente em seu discurso, só não se sabe se terá consistência e durabilidade. Estava lá, ele, pasmem, de máscara, em aparição pública. Também passou a defender a vacinação em massa: ”a vacina será nossa arma”. E foi além: teve a coragem de negar que disse que Covid-19 era só uma gripezinha. Enfim, isso é o que se pode chamar de “efeito Lula”.
Nas redes sociais, muitos não pouparam Bolsonaro, falando da importância da concorrência política, em tom jocoso, para melhorar a qualidade do discurso do presidente, ao menos. Só não sabemos, ainda, se tudo não passa de retórica inconsequente para acalmar o povo, cada vez mais desesperado por vacinas. Pois, na quinta-feira, em uma de suas costumeiras lives, insistiu no discurso contra o fechamento do comércio, inclusive, revelando imagens de um feirante, que teria se suicidado por dificuldades financeiras.
Lamentavelmente, chegamos a esse ponto: sentir que precisamos da ameaça de Lula e o PT voltarem ao poder para fazer Bolsonaro admitir que a vacinação em massa é fundamental para superarmos essa tragédia da pandemia. Se Bolsonaro continuar a patinar na compra de vacinas, cada vez mais raras no mercado, o povo terá de torcer por mais discursos de Lula na mídia, com direito a destaque no Jornal Nacional, a fim de “pressionar” Bolsonaro na compra de vacinas? Seria cômico, se não fosse trágico…
Sobre as eleições presidenciais, acredito que não seria o momento agora de dar como certa uma candidatura de Lula em 2022. Talvez, ele mesmo conclua que lançar um nome novo, por mais que se revele um “poste”, seja uma alternativa melhor ante seu desgastado nome. Segundo pesquisa da XP-Iespe, mesmo com Lula no páreo, somente Sérgio Moro venceria Bolsonaro no segundo turno. A pesquisa foi feita logo após a anulação das condenações de Lula, com 800 entrevistados. Ou seja, creio que nem é preciso pesquisa para saber que Lula conta com alto índice de rejeição. Talvez, até um pouco mais que Bolsonaro.
Tanto os que rejeitam o PT, como os que rejeitam Bolsonaro, desde já comentam sobre a necessidade de criação de uma candidatura que represente uma terceira via em 2022. Um nome capaz de trazer alguma identificação tanto em quem rejeita Lula, como em quem rejeita Bolsonaro. O ex-ministro Sérgio Moro poderia representar essa terceira via? Acredita-se que é uma possibilidade. Tanto que seus admiradores, lava-jatistas, já fazem pré-campanha pra ele nas redes sociais. Mas, será que Moro quer e conseguirá, mesmo, lançar uma candidatura? A probabilidade parece grande, uma vez que ele não tem saído da mídia desde que deixou o ministério, tendo se tornado colunista da revista Crusoé, da equipe do jornalista Diogo Mainardi, também um dos responsáveis pelo site de notícias O Antagonista. Por outro lado, Moro é uma pessoa bastante discreta quanto a suas reais intenções, e bastante calculista quanto a vantagens em correr riscos. De resto, outros bons nomes para uma terceira via ainda não surgiram e, talvez, não surjam, com tão pouco tempo pela frente. Tem o Luciano Huck, que não dá nem para levar a sério, e o Ciro Gomes. Só que o Ciro já conta com um passado político muito extenso e controverso. Já adquiriu a pecha de oportunista dos mais inconstantes. Adepto do morde e assopra, não transmite a confiança necessária para quem não quer mais nem o PT, nem o Bolsonaro. Porém, Ciro até poderia vencer num cenário em que os avessos a polarização Lula e Bolsonaro se encontrassem entre a cruz e a espada, e sem Moro na disputa. Seria o voto anti-polarização, muito mais um ‘não’ aos dois extremos, do que propriamente um ‘sim’ a seu nome.