Estamos vivendo mais uma crise na economia, a decorrente da acelerada automação, acompanhada agora da sanitária e, no Brasil, também da política — todos concordam.
Vai durar muito? Só divergimos quanto ao prazo. Também se discutem as responsabilidades. Foram inconsequentes? Parece que sim. Desligaram-se os controles? Tudo indica. E assim por diante, um monte de acusações e caça aos culpados e até de alguns bodes expiatórios. Por que não lembramos do Millôr? “Imprensa é oposição. O resto é armazém de secos e molhados.”
Ora, porque não concordarmos todos que a crise foi e é, afinal e antes de tudo, além de falta de planejamento, um fenômeno de amoralidade e ausência de ética, de esquecermos que nosso direito e necessidade terminam onde começa os dos outros – fingindo não saber -, que se alguém ganha, alguém em consequência perde. E quando se ganha exageradamente, o mesmo ocorre, de sinal trocado. A todo débito corresponde um crédito, já assegurava há muito o matemático e frade franciscano Luca Pacioli.
Mesmo com a foto esmaecida, confusa, vamos parar de chorar e apresentar uma proposta.
Funcionaria assim: o Governo Federal concederia estímulos creditícios e fiscais, benefícios cambiais e exclusividade em fornecimento aos governos estaduais. Em troca, as empresas se comprometeriam em não despedir seus efetivos – por um prazo específico, principalmente, nos setores mais críticos e para os níveis hierárquicos menos elevados, até três ou quatro salários mínimos, por exemplo -, e preparar os que seriam para uma 2ª carreira.
Quixotesco? Por incrível que pareça, isso até já funcionou. No Brasil, há 55 anos, Roberto Campos, ministro Extraordinário do Planejamento e Coordenação Econômica, e Octávio Gouveia de Bulhões, da Fazenda, propuseram pacto para conter a explosiva inflação. As empresas se comprometiam manter seus preços estáveis por 10 meses em troca daqueles estímulos e preferências. A adesão ao pacto foi liderada pela indústria automobilística, que, pela sua importância à época na cadeia produtiva, trouxe a reboque os fornecedores (aço, pneus, borracha, plásticos,têxtil…) e estes foram puxando a adesão à CONEP/SUNAB dos petroquímicos, alimentícios…Para ficar num exemplo de passado recente.
Entre as inegáveis vantagens de tais medidas é que elas seriam divididas, ônus da “acomodação” que as crises vem imperiosamente exigindo -, com o setor Privado, da iniciativa estatal de salvação pública para a racionalidade mais cuidadosa e efetiva dos gestores empresariais, do atacado de medidas populistas e bombásticas para o varejo das iniciativas estratégicas e objetivas.
Ficam o comentário e a sugestão. Para grandes e desconhecidos males, homéricos remédios. Enfim, continuamos a chorar o leite derramado ou construímos novas oportunidades, realimentando e engajando todos corajosamente mais e melhor nosso plantel leiteiro?
Luiz Affonso Romano, Consultor, membro do conselho consultivo da Associação Brasileira de Consultores e diretor do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças