O presidente Lula assinou, nesta semana, o PL – Projeto de Lei Complementar que regulamenta a categoria dos motoristas de transporte por aplicativo, reconhecendo-os como trabalhadores autônomos, mas propondo regras e diretrizes. O PL segue para o Congresso Nacional para apreciação em plenário, em regime de urgência. O projeto de lei, logo que anunciado, tem causado muita indignação por parte dos motoristas de aplicativos, que não consideram vantajosa a regulamentação proposta pelo governo. Já os clientes dessa modalidade de transporte, temem um possível repasse da fatia que o governo quer arrecadar ao valor da corrida, encarecendo-se o serviço.
Proposta desvinculada da realidade
O PL propõe um modelo de trabalho que, muitas vezes, não atende a realidade de muitos motoristas. Prevê, também, o pagamento de um salário mínimo, pelo menos, para uma jornada de oito horas de trabalho diárias, que pode ser estendida para, até, doze horas mediante negociação coletiva. E, quando se fala em acordo coletivo, o governo quer dizer que sindicatos precisam entrar no meio da negociação, fazendo a intermediação. Mais um ponto que tem desagradado a categoria, que não quer sindicatos envolvidos.
“Bico” para renda extra
A realidade é que há motoristas que prestam serviço nas plataformas de transporte por aplicativo como segunda profissão, fazendo um “bico” para uma renda extra, contando com a autonomia de trabalharem quantas horas quiserem por dia. Há universitários que fazem algumas poucas horas de corridas por dia, ou semana, para obterem um dinheiro extra para pagar os estudos. É uma categoria bastante diversificada, havendo muitas situações diferenciadas entre seus prestadores de serviço. Outro ponto que não contempla as necessidades da categoria, é o estabelecimento de um pagamento mínimo de R$ 32,10/hora previsto no projeto. Motoristas não gostaram da proposta, alegando que as empresas costumam pagar mais que esse valor a hora. Além da proposta do governo não contemplar a quilometragem rodada, que é o cálculo que realmente importa quando se trata de serviço desta natureza. Teme-se que o trabalhador passe a receber menos do que já recebe, desobrigando as empresas de pagarem mais que o valor da hora mínima estabelecida por lei. A tendência, acreditam os motoristas, é a remuneração injusta, sem considerar a produtividade de quem “rodou” mais ou menos durante a hora trabalhada.
Desconto de 27,5% ao INSS
De acordo com a proposta do governo, o desconto para a Previdência passa a ser obrigatório, sendo 20% pagos pela empresa e 7,5% pelo motorista. Ou seja, muito provavelmente, haverá um repasse desses custos ao consumidor, encarecendo o valor da corrida. Clientes temem que o valor da corrida venha a equiparar-se ao dos serviços de táxi.
Aumento da arrecadação
Com a obrigatoriedade de contribuição para a Previdência Social, o governo estima arrecadar R$280 milhões. De acordo com o IBGE de 2022, há 1 milhão e 500 mil motoristas de aplicativo no país. Uma obrigatoriedade que só faz sentido para a intenção arrecadatória do governo, pois, os motoristas de aplicativo já contam com a alternativa de contribuir para a aposentadoria a partir do MEI (Microempreendedor Individual). E há aqueles motoristas aposentados e que obtem, apenas, uma renda extra trabalhando na Uber, no 99 Pop ou outros. O governo também parece não considerar aqueles trabalhadores que já pagam aposentadoria por meio de outra profissão que exercem, paralelamente.
Motoristas e clientes prejudicados
A proposta, enfim, desagrada a maioria dos interessados: motoristas e clientes. O projeto de lei foi debatido durante cerca de um ano, em acordo fechado entre governo, as empresas Uber e 99 Pop e representantes de centrais sindicais. Porém, as associações e federações da categoria de motoristas por aplicativos não foram ouvidas. O presidente da Federação dos Motoristas por Aplicativos do Brasil, Paulo Xavier, disse a Rádio Itatiaia que os verdadeiros representantes da categoria não foram ouvidos, que seriam as associações e federações. E que estes vão lutar no Congresso Nacional para que o PL não seja apreciado em regime de urgência, garantindo tempo, assim, para um debate em que os motoristas possam ser representados em seus interesses, tendo em vista modificações significativas no texto original pelos parlamentares.
Revolta e indignação
Nas redes sociais, a categoria de motoristas por aplicativo tem expressado revolta e indignação contra o PL. Fala-se inclusive em mobilização nacional a fim de sensibilizar os parlamentares para que não aprovem o texto encaminhado pelo governo.
Ifood disse “não”
O governo também queria incluir a categoria dos motoentregadores do Ifood, porém, a empresa não quis acordo com o governo, até o momento. Muito se comenta que a proposta do governo deverá acarretar no fechamento das empresas por queda na clientela e desinteresse dos motoristas em continuarem trabalhando no setor. É pouco provável que as empresas encerrem as atividades, uma vez que houve acordo do governo com a Uber e o 99 durante a elaboração do projeto. É absolutamente improvável que empresas privadas tenham aceitado um acordo não vantajoso em termos de lucratividade. O mais provável é que as desvantagens recaiam para os motoristas, mesmo, e possivelmente, para os usuários desse tipo de transporte, que correm o risco de passar a pagar por um serviço mais caro.
Taxistas e empresas de ônibus
Quem deve ter gostado dessa proposta do governo devem ser os taxistas e as empresas de ônibus que fazem o transporte público coletivo nos municípios. Com um eventual encarecimento dos valores das corridas do transporte por aplicativo, muitos clientes de menor poder aquisitivo voltarão a depender, apenas, do “busão”. Já os de maior poder aquisitivo, poderão considerar substitui-lo pelos serviços de táxi, que contam com diferenciais relacionados a mais segurança e tranquilidade. Afinal, a qualidade dos serviços da Uber e concorrentes já foi bem melhor em seus primeiros anos de mercado, quando clientes eram cativados por um tratamento bastante gentil e elegante com o intuito de vencerem a concorrência dos taxistas. Ultimamente, a onda de insatisfação entre motoristas de aplicativos tem crescido, a partir de constantes reclamações sobre exploração das empresas e clientes “mal educados”, além de corridas “desvantajosas”, financeiramente. Mas, o projeto do governo, segundo protestos dos motoristas nas redes sociais, só traz perspectivas piores, ainda.