É indiscutível a importância dos investimentos em saneamento, que são capazes de reduzir doenças, principalmente aquelas de veiculação hídrica como diarreia, gastroenterite, cólera, hepatite A, verminoses, arboviroses, entre muitas outras. De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), 88% das mortes por diarreia no mundo são causadas pela falta de sistema de tratamento de esgoto de qualidade.
Um recente estudo do Instituto Trata Brasil mostra que o País contabilizou 191 mil internações por doenças de veiculação hídrica em 2023, superando os 143 mil registrados em 2022. Ainda hoje, 32 milhões de brasileiros não têm acesso à água tratada e mais de 90 milhões moram em casas sem coleta de esgoto. Esse panorama é ainda mais desalentador ao saber que 41,7% das crianças brasileiras, de 0 a 5 anos de idade, vivem em moradias desabastecidas de infraestrutura de saneamento, segundo estudo do Observatório do Marco Legal da Primeira Infância. Além do comprometimento com a saúde, essa é uma população que pode ter impactos para a vida toda. Os idosos também são impactados com as condições de infraestrutura. Em 2022, 79,2% dos óbitos atribuídos a fontes de água inseguras, saneamento inseguro e falta de higiene ocorreram entre idosos de 60 anos ou mais, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
As soluções existem e passam pelo aumento de recursos para o setor. Segundo dados da OMS, para cada dólar investido em saneamento, pode-se contabilizar uma economia de 4 dólares em tratamento de saúde. Alguns especialistas acreditam que esse valor pode ser, inclusive, ainda maior, dependendo da localidade onde esses recursos são aplicados.
Infelizmente, uma parcela significativa dos municípios ainda não consegue fazer os investimentos necessários para a universalização dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário. O Instituto Trata Brasil preparou um estudo com investimentos totais das cidades por habitantes e constatou que a média equivale a R$ 138,68 por habitante em 2022. Segundo o levantamento, 42 localidades investem menos de R$ 100 por habitante, valor equivalente a menos da metade do patamar de R$ 231,09 considerados necessários e apontados pelo Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab). A pesquisa mostrou ainda que 17 municípios aplicam mais de R$ 200 por habitante. Dentro desse grupo, dez destinam valores acima do padrão de excelência.
A aprovação do Novo Marco Legal do Saneamento, em julho de 2020, trouxe novas e importantes perspectivas para o avanço da infraestrutura do setor. A nova legislação ampliou o interesse dos investidores e o número de concessões vem aumentando nos últimos anos. Porém, o ritmo está aquém do necessário para o atendimento das metas estabelecidas para 2033.
Por isso, é importante o esforço de cada município na busca da universalização dos seus serviços. O Boletim do Saneamento é um importante instrumento para ajudar os gestores públicos e privados no atendimento das demandas do setor. Trilhando esse caminho, buscando soluções para os problemas locais, conseguiremos avançar com maior agilidade no atendimento dos objetivos do Marco Legal do Saneamento e oferecer condições de vida digna, principalmente para a população mais pobre do País.
Elzio Mistrelo é engenheiro, diretor administrativo e financeiro da Apecs (Associação Paulista de Empresas de Consultoria e Serviços em Saneamento e Meio Ambiente) e coordenador do Boletim do Saneamento