Não houve outra alternativa. As condições atuais do cenário econômico brasileiro, com uma desvalorização de 6% do dólar em um intervalo de 45 dias — aliadas à pressão que os preços começam a sofrer desde já em decorrência do mercado de trabalho aquecido —, fizeram com que o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (Bacen) não tivesse outra opção que fosse ajustar a taxa básica de juros, a Selic, em mais de 0,5 ponto porcentual (p.p.), chegando a 11,25%. Na visão da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), a medida é apenas consequência natural do contexto presente.
Alguns pontos valem ser explorados. Um deles é justamente o mercado de trabalho, que permanece muito aquecido. No trimestre encerrado em setembro, a taxa de desemprego caiu ainda mais, para 6,4% — retrações de 0,5 p.p., em relação ao trimestre anterior, e de 1.3 p.p., na comparação com o mesmo período do ano passado. É o segundo patamar mais baixo da história da medição, de responsabilidade do IBGE, perdendo apenas para os 6,3% registrados em dezembro de 2013. Se é um indicador positivo, de alguma forma, também significa pressão sobre custos, já que, conforme a renda média dos brasileiros sobe (foi de R$ 3.227, no trimestre encerrado em agosto, alta de 3,7% em relação ao mesmo intervalo de 2023), elevam-se também os preços da economia.
O Copom já havia notado esse fato na reunião passada, quando ajustou a Selic nessa mesma magnitude. O último IPCA-15, publicado pelo IBGE em outubro, aumentou essa preocupação do mercado, apontando uma subida de 0,54% em comparação ao mês anterior. No ano, o índice já acumula alta de 3,71%, não tão distante da banda superior da meta do Bacen para 2024 (4,5%). Na verdade, há um temor cada vez mais presente de desancoragem da inflação. Não à toa, no último boletim Focus, divulgado no dia 1º, a previsão do IPCA de 2024 — que estava em 4,38% há quatro semanas — foi de 4,59%. Para 2025, já passou de 3,97% para 4,03%.
E não só isso: a oferta também está pressionada, embora nem todos estejam notando esse fenômeno. A capacidade instalada da Indústria, mensurada pela Fundação Getulio Vargas (FGV), estava em 84,6% em setembro, por exemplo. É o maior patamar do índice desde 2013.
Há ainda, nessa conjuntura, o ritmo forte da economia brasileira, que cresceu 2,91% nos oito primeiros meses deste ano, uma taxa maior do que o acumulado de 12 meses (2,49%). Essa circunstância fica ainda mais evidente considerando que, no trimestre encerrado em agosto, houve elevação de 3,96% do indicador em comparação ao mesmo período de 2023.
Para além desse contexto todo, o Copom se baseou novamente no aspecto fiscal, como acontece há algumas reuniões. Entre janeiro e agosto, o governo federal acumulou um déficit primário de 2,29% do PIB, taxa muito acima do arcabouço estipulado no fim de 2023. Considerando o pagamento de juros, esse valor sobe para 9,81% do PIB — ou seja, uma taxa insustentável. Não é à toa que o mercado permanece à espera de uma sinalização mais robusta sobre o corte de gastos que vem sendo comentado há alguns meses, mas que ainda não saiu do campo das narrativas. De fato, até agora, o Executivo não apresentou nada.
Como se não bastassem as questões internas, a Selic já é o primeiro impacto do resultado da eleição presidencial nos Estados Unidos, definido nesta madrugada (6). Os mercados entendem que o próximo mandato de Donald Trump pode ser marcado pela implementação de tarifas protecionistas e, em paralelo, por nenhuma perspectiva de ajuste fiscal, fazendo com que a potência econômica do mundo se torne um país inflacionado. O efeito disso são juros altos no longo prazo e, por consequência, câmbio valorizado em relação ao real. O Copom, certamente, já mediu esses efeitos.
Nas próximas reuniões, o comitê deverá ser pautado pelo pacote fiscal que o governo prometeu anunciar e pelos primeiros movimentos do novo presidente norte-americano.