Em janeiro de 2024, a Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa da Câmara aprovou projeto de lei que altera o Código de Processo Civil para conceder gratuidade de Justiça a idosos e portadores de doenças graves.
A gratuidade inclui taxas ou custas judiciais, selos postais, honorários do advogado e do perito, remuneração do intérprete ou tradutor e até despesas com a realização de exame de DNA. Atualmente, o Código de Processo Civil concede isso a qualquer pessoa, inclusive estrangeiros, que não tenham condições de arcar com essas despesas.
Para Renata Belmonte, Líder em Recuperação de Créditos do escritório Albuquerque Melo, o projeto de lei é descabido e sua aprovação pode suscitar uma avalanche de PLs que determinem a gratuidade a diferentes categorias de cidadãos. “A gratuidade tem relação exclusiva com a vida financeira, jamais com relação à idade ou com portar alguma deficiência. Não se ignora os custos, porém, tem que se analisar o caso concreto. Um portador de deficiência não é, necessariamente, pobre na acepção jurídica do termo. Não se julga alguém pobre pela idade, não se julga alguém pobre pelo fato dele ser ou não portador de deficiência”, critica.
No final do ano passado, a Corte Especial do STJ iniciou o julgamento de recursos repetitivos para definir se, na apreciação do pedido de gratuidade da justiça pelo juiz, é legítima a adoção de critérios objetivos na avaliação de hipossuficiência – quando se comprova que uma das partes não está em condições de arcar com as taxas e custas exigidas para a tramitação de um processo judicial sem prejudicar o seu sustento.
Segundo Belmonte, que diz ter certeza que a questão vai “bater no STF” para que se apure a interpretação correta da Constituição sobre o tema, cada vez mais órgãos fazem uma análise financeira de quem quer esse benefício. “Em que pese a declaração ter presunção de veracidade, é uma presunção relativa e os juízes têm por bem analisar alguns requisitos. O primeiro deles, sem dúvida, é sobre o objeto da ação. Se a pessoa reclama de overbooking de voo internacional, por exemplo, soa minimamente estranho ela ser pobre na acepção jurídica do termo. Nesse sentido, os juízes têm requerido a comprovação da situação financeira”, argumenta.
Um dos temores é de que, caso o STJ considere que os critérios devem ser objetivos, muitas pessoas podem ter quer provar que não conseguem pagar por serviços judiciais.
Mas Belmonte diz que o advogado, em casos assim, precisa demonstrar a realidade financeira de quem está requerendo a gratuidade. “Ser pobre, na acepção jurídica do termo, não significa que a pessoa tem que gastar absolutamente tudo o que ganha e não ter nenhum real guardado em conta para uma emergência. Pelo contrário. Significa que a pessoa, se pagar as custas do processo, terá prejudicado o seu sustento ou de sua família. E aí cabe ao advogado saber mostrar isso para o juiz, explicando a vida financeira e a realidade familiar daquele que pleiteia o benefício”, analisa.