Enquanto troca-se acusações, ninguém debate o fundamental sobre a Amazônia
Jornalista responsável dos jornais do Grupo Paraná Comunicação (A Gazeta Cidade de Pinhais, A Gazeta Região Metropolitana, Agenda Local e Jardim das Américas Notícias)

Enquanto troca-se acusações, ninguém debate o fundamental sobre a Amazônia

Como era de se esperar, o assassinato do jornalista inglês radicado no Brasil Dom Philips e do indigenista Bruno Pereira, na Amazônia, tem sido politizado pela esquerda e pela imprensa. Culpa-se o governo Bolsonaro. Como se a criminalidade na Amazônia tivesse surgido há pouco mais de três anos.

Este é mais um fato em que não se tem discutido com objetividade os problemas nele implicados. A esquerda quer mais um crime para politizar, tendo em vista capitalizá-lo em pleno ano eleitoral, como fez com o assassinato da vereadora Marielle. Por outro lado, o presidente Bolsonaro também não colabora, fazendo declarações que terminam por pesar contra si próprio. Tem dito coisas que, no mínimo, demonstram descaso e desconhecimento sobre as vítimas. Chamou o jornalista e o indigenista de “aventureiros”, sendo que ambos trabalhavam na região já há muito tempo. Para piorar, dias depois, disse que Dom Philips era “mal visto” por garimpeiros. Ou seja, deu a entender que o jornalista estava arranjando confusão com pessoas na região. Ora, para bom entendedor, meia palavra basta. A fala de Bolsonaro insinua que a vítima teria sua parcela de responsabilidade pelo crime sofrido, uma vez que desagradou, supostamente, garimpeiros. Ah… E quer dizer, então, que não se pode desagradar garimpeiros, pois, são eles que mandam por lá?

Vítimas ou culpados?

É muito lamentável que um presidente da República insinue que vítimas de um crime bárbaro possam ser responsáveis pelo acontecido, seja por imprudência ou negligência. Ambas as vítimas eram bastante experientes na região, certamente, sabiam onde e com quem estavam se envolvendo. O que ocorre é que há profissões que oferecem riscos muito maiores que outras, mas, quem as cumpre está ciente destes riscos pelo sentido de missão que certos ofícios inspiram. Bombeiros, policiais, também são exemplos de profissões nestas condições de elevado risco. Mas, nem por isso, vamos culpar estes profissionais por eventuais danos que venham sofrer no exercício da profissão, não?

Confissão nas entrelinhas?

Realmente, o comentário do Bolsonaro, nas entrelinhas, revela algo de muito mais grave. Afinal, ele termina por admitir que trabalhar na Amazônia é semelhante a uma “aventura” justamente por se tratar de uma “terra sem lei”, completamente dominada pela criminalidade, onde um Estado paralelo se faz presente, uma vez que o Estado, de fato, não atua como deveria na região. A declaração do presidente da República nada mais é do que um atestado de incompetência (e, talvez, omissão) do Estado para cuidar da segurança de quem pela Amazônia transita. Como quem diz: ”quem mandou andar por aquela favela dominada pelo tráfico de drogas e milícias?”. Em outras palavras, quis dizer que a Amazônia já chegou a esse ponto: encontra-se numa situação comparável a de uma favela dominada pela criminalidade onde a polícia e o Estado não têm mais nenhum poder ou autoridade.

Tanto não é justo culpar Bolsonaro, quanto não é justo culpar as vítimas. Os problemas da Amazônia não são novos, vêm de muitas décadas. Já tivemos o assassinato de Chico Mendes, o de Dorothy Stang… E realmente, como Bolsonaro disse, não se culpou o governo Lula, em 2005, pelo assassinato da missionária norte-americana.

“Passar a boiada”

É claro que há questões que podem ser levantadas sobre o atual governo muito pertinentes. Quem lembra do ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, naquele vídeo onde dizia que era o momento de “passar a boiada” enquanto a imprensa estava distraída com a pandemia? O vídeo que veio à tona com a saída de Sérgio Moro do ministério em que, na reunião, o então ministro Salles referia-se a um afrouxamento de diversas legislações ambientais a fim de facilitar a vida de toda sorte de exploradores do meio ambiente, a exemplo de madeireiros, garimpeiros. É inegável que o governo Bolsonaro teve, entre suas plataformas eleitorais, a flexibilização de leis ambientais e esta sempre foi uma das bandeiras de seu governo, desde a época da campanha eleitoral. Mas, isso não torna governos anteriores menos responsáveis pela situação a que chegou a Amazônia brasileira. Nunca houve um plano de desenvolvimento para a Amazônia. Nunca houve preocupação com a qualidade de vida daquelas populações. Nunca houve nenhum projeto de combate a todas as ilegalidades e crimes ambientais praticados por lá. Nunca houve forte presença do Estado no combate ao tráfico de drogas nas fronteiras com o Peru e Colômbia, ou no combate a todo tipo de contrabando na floresta. Exploração ilegal de madeira, por exemplo, muito antes do Bolsonaro já acontecia indiscriminadamente. Enfim, apesar de todos os pontos dignos de críticas ao governo Bolsonaro, daí a culpá-lo por esses assassinatos já passa do ponto, da linha do bom senso.

Disputa insana

Mas, nada mais surpreende em meio a tanta polarização política, em ano eleitoral, mais uma politização de um caso de assassinato. Muito provavelmente, a morte de Dom Philips e de Bruno Pereira será explorada a exaustão durante a campanha eleitoral. O mais lamentável é que tanto a esquerda quanto a direita não estão colocando a questão de forma objetiva e respeitosa. Apoiadores do presidente Bolsonaro também têm pegado pesado contra as vítimas no afã de defender o presidente. ”O que estavam fazendo num lugar perigoso como aquele”?; ”Também, foram se meter com bandidos, e não queriam sofrer represálias?”… Comentários assim, nesse nível, podem ser vistos nas redes sociais, demonstrando que muitos brasileiros perderam a real noção dos fatos em nome de defesas ideológicas e de disputas políticas insanas… Tudo muito triste quando um pouco de empatia e bom senso seriam o recomendável, apenas. E, no meio disso tudo, ninguém lembra de discutir o fundamental: o que fazer para combater tantos problemas na Amazônia sem endossar o discurso da esquerda de que é preciso internacionalizá-la já que o Brasil não dá conta de cuidar dela?

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