Bets colocam o comércio varejista em jogo

Bets colocam o comércio varejista em jogo

A legalização das apostas esportivas eletrônicas no Brasil, formalizada pela Lei nº 13.756/2018, introduziu as apostas de quota fixa, permitindo aos apostadores conhecerem previamente os possíveis ganhos ou perdas. Sua regulamentação veio a ocorrer em 2023, com a criação de uma Medida Provisória que prevê taxas de operação e tributação sobre os lucros, visando a transparência e o controle ao mercado, mas desafios como fraudes, vício em jogos e empresas fora das normas ainda persistem, exigindo maior fiscalização e medidas governamentais.

O que nem o Ministério da Fazenda esperava é que a liberação das apostas esportivas trouxesse consigo uma nova dinâmica econômica que está causando impactos profundos e negativos, especialmente nas camadas mais vulneráveis da população e, por consequência no comércio.

As apostas, popularmente conhecidas como “bets”, estão consumindo parte significativa da renda dos brasileiros, afetando diretamente o comércio e o orçamento familiar, conforme indicam os mais recentes dados e levantamentos, inclusive do próprio Banco Central.

 

Estrago

Para se ter uma ideia do estrago que os jogos estão trazendo, um exemplo claro desse impacto é o resultado apresentado pela rede de supermercados Assaí. A empresa apontou que o mercado de apostas esportivas tem diminuído o volume de compras em seus estabelecimentos, uma vez que os consumidores estão destinando uma parcela crescente de sua renda para jogos de azar. Este fato confirma que o dinheiro, antes gasto em necessidades básicas, agora está sendo redirecionado para as apostas, prejudicando diretamente o comércio local e, consequentemente, a economia como um todo.

 

Bolsa Família

Outro dado alarmante é o levantamento realizado pelo Banco Central (BC) que revelou que, somente no mês de agosto de 2024, beneficiários do programa Bolsa Família gastaram R$ 3 bilhões em apostas eletrônicas, sendo R$ 2 bilhões transferidos via Pix por chefes de família. Este montante expressivo, retirado dos bolsos de milhões de brasileiros que dependem de programas sociais, acende um sinal de alerta para o efeito devastador que esse tipo de jogo pode ter no orçamento das famílias mais pobres.

O mais preocupante é que, embora o levantamento do BC tenha se concentrado nas transações via Pix, o valor real gasto pode ser ainda maior, já que outras formas de pagamento, como cartões de débito e crédito, não foram incluídas na pesquisa. Além disso, não foram contabilizados os prêmios recebidos pelos apostadores, sugerindo que, mesmo em um cenário de possíveis ganhos, o impacto líquido sobre a renda familiar é considerável.

 

Círculo vicioso

O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, expressou recentemente sua preocupação com o crescimento descontrolado das apostas. Ele destacou que, desde janeiro, as transferências via Pix para plataformas de apostas triplicaram, aumentando 200%. Esse fenômeno está diretamente ligado ao aumento da inadimplência, especialmente entre as famílias de baixa renda e, em muito breve, refletirá na retração das vendas no comércio varejista.

A aposta, que inicialmente poderia parecer uma forma de entretenimento, está se transformando em uma armadilha financeira, criando um círculo vicioso de endividamento.

A correlação entre as apostas e o comprometimento da renda das famílias mais pobres é clara. Muitas vezes, esses recursos são vitais para a subsistência, o que agrava ainda mais a situação, deixando essas famílias sem condições de cobrir suas necessidades básicas, como alimentação e saúde, além de vestuários, eletrodomésticos e outros artigos necessários ao consumidor.

 

Correr atrás do prejuízo

Agora ficou evidente que a liberação das apostas esportivas no Brasil foi um erro. A falta de regulamentação e controle efetivo abriu as portas para uma verdadeira “pandemia” de apostas, como bem definiu o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. O governo federal anunciou, recentemente, a suspensão das bets que não tiverem pedido autorização para operar no país, mas essa medida é insuficiente. A regulamentação deveria ter sido mais rigorosa desde o início, evitando que as apostas se tornassem uma das principais causas de endividamento entre os brasileiros.

Agora, é hora de os governantes tomarem medidas enérgicas e contundentes. Deputados federais, senadores, o presidente da República e o Judiciário precisam agir para proteger as famílias brasileiras. A retirada imediata dessas plataformas, enquanto não houver um controle adequado, é uma medida urgente. Além disso, políticas públicas de conscientização sobre os perigos do vício em jogos de azar devem ser implementadas para reduzir o impacto social desse problema.

Resumindo, as apostas esportivas estão consumindo o orçamento das famílias brasileiras e prejudicando o comércio, enquanto agravam a situação de endividamento no país. A liberação do jogo de azar foi um erro que precisa ser corrigido, e a pressão sobre os governantes deve continuar até que medidas concretas e eficazes sejam tomadas para conter essa nova pandemia, agora financeira.

Fernando Moraes, presidente da Faciap – Federação das Associações Comerciais e Empresariais do Paraná

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