Neste período de quarentena, muitas famílias estão confinadas. E conviver demais com uma pessoa, pode virar motivo para alguns desentendimentos. No entanto, antes de mais nada é importante entender que, no domínio das relações familiares, os conflitos acontecem frequentemente.
Portanto, família é sinônimo de conflito. Só que é preciso saber ultrapassar cada situação dessa de modo construtivo em vez de evitá-los ou ignorá-los, reforça a neuropsicóloga Leninha Wagner: “No processo de pandemia, a primeira fase que tivemos que encarar foi o confinamento, a exclusão dos relacionamentos sociais. O homem como espécie é um ser relacional. As relações sociais, nos distraem de nós mesmos, nos sentimos seduzidos, tentados a fazer comentários da vida alheia e acabamos por nos distrair de nossos próprios conflitos”.
Mas, diante do excesso de vida íntima familiar, “nos damos conta de que nossas maiores questões estão dentro de nós e do nosso próprio lar. Uso a metáfora da cebola, para explicar isso de forma leve: Quando descascamos cebolas, as primeiras camadas, são leves, superficiais. Mas conforme vamos entrando na intimidade, cortando a cebola, picando, ela solta um gás que arde os olhos e faz chorar. O amor na intimidade familiar também arde e muitas vezes faz chorar”. Mas, calma, Leninha destaca que “a família ainda é o melhor tempero e sabor para a vida”.
Para evitar que os conflitos tragam consequências piores para a família, Leninha Wagner recomenda que “é fundamental que se mantenha a hierarquia aliada ao respeito às diferenças de cada um”. Além disso, “a hierarquia observada entre os familiares (pais e filhos) evitará grandes desacordos e até mesmo a implantação de restrições severas (punições), já que garantirá a prática dos espaços individuais. A base da boa convivência é a ordem: a manutenção de uma organização segura e flexível”, explica.
Ao mesmo tempo que os conflitos podem surgir dentro de casa, é fundamental compreender a importância da mesma como a melhor forma de solucionar estes problemas: “Quando a vida nos apresenta ameaças, dores, desafios, sofrimentos. A solução, o amparo, a compreensão vêm sempre da família. É claro que existem famílias disfuncionais, que não se encaixam nessa normativa. Mas por via de regra, é sempre nesta aliança, que nos sentimos importantes e pertencendo a um clã, que irá nos proteger, defender, e comprar a nossa briga. Ter amigos é o maior presente que nos damos, escolher irmãos de coração, por pura a finidade é o que de melhor podemos fazer por nós. Mas a família consanguínea tem a priori o compromisso, a obrigação, a responsabilidade de nos amar e nos defender”, reforça a neuropsicóloga.
Como saber lidar com conflitos
Quando se fala em conflito, é importante entender que esta palavra não é sinônimo de confronto, é sim uma divergência de opiniões. Porém, Lenina Wagner destaca que “quando as relações familiares chegarem a um momento conflituoso em que não mais exista o diálogo como um canal aberto e norteador da relação, ou mesmo diante de qualquer adversidade própria da convivência, é o momento de buscar ajuda profissional, que pode ser um terapeuta de família ou um psicólogo para auxiliar nesses momentos”.
Quando existem conflitos não resolvidos, “é muito provável que haja um maior distanciamento emocional da família, acarretando numa disfunção psicológica tanto dos pais, quanto dos filhos” ressalta. A falta de comunicação, que comumente é o fato gerador desses conflitos, somado à dificuldade de solucionar os problemas familiares, “pode desenvolver diversos fatores negativos tanto para o relacionamento amoroso dos pais como na criação dos filhos”.
De toda forma, Lenina reforça para a reaproximação da família cada um dos membros deve mudar de atitude: “É comum o orgulho ser o responsável pela maior quantidade de brigas em família. Cada um está preso numa imagem ideal de si mesmo. Um acha que é o mais correto, o outro o mais amoroso, outro diz que dá de si mais do que todos, outro que é o mais esperto. Assim giram as identidades falsas de si mesmos causando conflitos de poder, bloqueando a generosidade e impedindo que os outros se relacionem para além das próprias identidades orgulhosas”.
Além disso, a empatia também é um fator a ser colocado em pauta: “É a capacidade de se colocar no lugar do outro, de entender que o outro tem sentimentos e passa por momentos difíceis – assim como você. Isso é especialmente importante para reconciliar uma briga entre pessoas próximas”.
E o mais importante de tudo, reforça a neuropsicóloga: “Entender que os dois lados têm seus motivos que precisam ser levados em conta, é essencial para resolver conflitos. Isso também é importante para compreender quando os outros estão de mau humor, não querem conversar, não querem participar de atividades. Todo mundo tem direito a estar cansado, irritado ou apenas quieto às vezes. Compreender essa dinâmica, respeitar o seu limite e o dos outros, é parte integrante do bom convívio”, finaliza.