O lugar mais perigoso do mundo para uma mulher: dentro da sua própria casa

O lugar mais perigoso do mundo para uma mulher: dentro da sua própria casa

por Raquel Kobashi Gallinati

Cada vez mais, as mulheres ocupam lugares de destaque em suas profissões, possuem autonomia financeira, são referências em seu campo de atuação e conquistam seu espaço na sociedade. As vitórias na luta por igualdade, entretanto, escondem uma realidade perturbadora: a cada dois minutos, ocorre um caso de violência doméstica no Brasil. Livres nas ruas, muitas mulheres ainda são prisioneiras de uma rotina de agressões e medo dentro de suas próprias casas.

Os dados foram divulgados no final do ano passado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e fornecem um amplo panorama do que acontece no país. A rotina doméstica violenta ocorre gradativamente, com gritos, xingamentos e agressão física. Quando chegam a público, muitos casos já entraram nas estatísticas de feminicídio.

As agressões se arrastam durante anos, motivadas por ciúme, sentimento de posse e violência, muitas vezes ampliadas por fatores como abuso de álcool e drogas ilícitas. Quando a mulher decide romper com esse ciclo e denuncia o agressor ou põe um fim ao relacionamento, o caso chega ao conhecimento da polícia.

Quando a violência é conhecida, as autoridades agem rápido, com prisão dos acusados e medidas protetivas de urgência para as vítimas. Nada disso, porém, é suficiente para garantir a segurança das mulheres.

São muitos os casos de feminicídio em que o companheiro comete o assassinato após ter a fiança da sua prisão paga e desrespeitando ordens judiciais, como por exemplo, não ter contato e não frequentar os mesmos locais que a vítima.

No Dia Internacional da Mulher, é preciso reforçar o debate sobre como agir para evitar a violência doméstica se o crime ocorre dentro de casa, longe do alcance da polícia e da Justiça? A solução não está na ação policial, mas em ampliar a atenção da sociedade sobre o protagonista da violência: o homem agressor.

O autor do feminicídio chega ao extremo da violência por não saber reconhecer em si as diferenças e a fronteira entre o amor afetuoso e o sentimento possessivo e de ciúme. Frases como “se não ficar comigo, não vai ficar com mais ninguém” ainda são comuns.

Esse sentimento de posse é reforçado culturalmente quando a sociedade aceita figuras jurídicas ultrapassadas como a “legítima defesa da honra” e até pouco tempo considerava aceitável que o homem “lavasse a honra com sangue”.

Esse trecho de uma música interpretada por Sidney Magal mostra o entendimento que a sociedade tinha do feminicídio até poucas décadas atrás.

“Se te agarro com outro, Te mato

Te mando algumas flores, E depois escapo…

Dizem que eu estou errado, Mas quem fala isto

É quem nunca amou, Posso até ser ciumento

Mas ninguém esquece, Tudo o que passou…”

É preciso educar na escola, em casa, nas ruas, para que os jovens cresçam com o conhecimento de que a relação é baseada em amor e afeto, sentimentos capazes de construir um relacionamento sólido, de carinho e confiança.

Quando esse sentimento se transforma em ciúme, necessidade de controle e raiva, o homem precisa saber que a relação não está no caminho certo.

Por mais que pareça um paradoxo, a violência contra a mulher só vai deixar de existir quando a sociedade concentrar suas forças na educação dos homens.

O caminho é longo e até lá, a polícia estará atenta para proteger as vítimas de violência.

Raquel Kobashi Gallinati, Presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo

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