Presidente Bolsonaro azeda ainda mais relações com Congresso e STF

Presidente Bolsonaro azeda ainda mais relações com Congresso e STF

por Vanessa Martins de Souza

Entornou o caldo o compartilhamento de dois vídeos em favor do ato anti-Congresso, marcado para o dia 15, pelo Presidente Jair Bolsonaro. Mais uma vez, o presidente da República poderia ter evitado agravar o desgaste com o Congresso Nacional. Ao compartilhar vídeos pelos Whatsapp em apoio às manifestações populares contra o Congresso e o STF, o chefe do Poder Executivo indispõe-se com o parlamento e a Suprema Corte de maneira antidemocrática, beirando o autoritarismo. O Brasil é uma República Federativa Democrática em que os três poderes governam juntos – Executivo, Legislativo e Judiciário – de forma independente entre si.

Testar os limites da democracia

Embora a percepção seja a de que quem mais esteja governando é o Congresso Nacional e o STF, é lamentável que o chefe do Poder Executivo tenha endossado apoio ao ato popular contra os outros dois poderes da República. A impressão é a de que há uma forma de testar os limites da democracia, buscando naturalizar a ideia de uma ruptura com o processo democrático a partir do incentivo desse tipo de manifestação de extrema-direita.

Muito embora, o Palácio do Planalto esteja encontrando sérias dificuldades em aprovar projetos no parlamento, é inconcebível que um presidente da República não busque acima, de tudo, o diálogo com o Poder Legislativo a fim de formar uma base aliada consistente. Temos uma Constituição Federal absolutamente democrática, em que a independência entre os três poderes constitui-se em um dos pilares da democracia. As falas e os atos do presidente da República têm limites. Bolsonaro justificou no Twitter que o compartilhamento dos vídeos seria de “cunho pessoal”, em grupo do Whatsapp, e que qualquer tentativa de se fazer ilações fora desse contexto pessoal seriam tentativas rasteiras de tumultuar a República.

“De cunho pessoal”

Porém, o presidente da República parece não se dar conta de que, na qualidade de detentor do cargo de chefe do Poder Executivo, não há mais espaço para atos e falas de “cunho pessoal” quando se trata de um contexto para além da esfera privada. Compartilhar mensagens por um aplicativo de envio de mensagens como o Whatsapp envolve uma esfera de atuação pública. Afinal, o próprio ex-deputado federal Alberto Fraga, amigo pessoal do presidente, confirmou à Folha de São Paulo ter recebido o compartilhamento de um dos vídeos pelo presidente. Não se tratava de um contexto íntimo e pessoal, mas de grupo de relações de Bolsonaro em um ambiente virtual que, como todos sabem, não há controle sobre o alcance e extensão dos compartilhamentos de mensagens, que são replicadas de forma imprevisível.

Falta de privacidade e segurança no ambiente virtual

Aliás, causa muita estranheza o fato do presidente Bolsonaro ainda não ter aprendido com erros passados, deixando de tomar extremo cuidado com o que comunica via Whatsapp e redes sociais. É impressionante verificar que um presidente da República pareça não ter se dado conta de que é um chefe de Estado, não, um cidadão comum. E que, como tal, deve zelar pela estratégia, discrição e ponderação em sua comunicação, seja pela imprensa, redes sociais ou Whatsapp. Vazamentos de conversas pelo Whatsapp, por exemplo, já geraram muita confusão com membro do governo, o ministro Sérgio Moro. Não há segurança absoluta nesses aplicativos de mensagens, até uma criança sabe. Desse jeito, Bolsonaro nem precisa de inimigos, pois, tem se revelado seu maior inimigo ao dar munição de mão beijada para a imprensa e a oposição.

Pauta radicalizada

As manifestações do dia 15 já estavam marcadas desde o final de janeiro, porém, a pauta foi radicalizada após gravação de uma fala do General Heleno, que comentou nos bastidores, sem saber que estava sendo gravado, que o Congresso estaria se comportando como “chantagista“. “Nós não podemos aceitar esses caras chantageando a gente”, disse o General, no dia 17, sobre o que qualifica de chantagens do Legislativo para avançar sobre o dinheiro do Executivo. Bolsonaristas, desde então, radicalizaram a pauta do ato sugerindo até o apoio das Forças Armadas contra o Congresso, insinuando uma possibilidade de ruptura da democracia. Ora, o simples ato de um presidente compartilhar vídeos de apoio a um ato popular em que o objetivo é pressionar o Congresso, pedindo a saída dos comandantes do Senado e da Câmara, respectivamente, David Alcolumbre e Rodrigo Maia, já incorre em endosso a tal manifestação.

Chantagens de lá e de cá

Por mais que haja dificuldades de negociação com o Congresso e eventuais “chantagens” em troca de apoio a projetos, não é compatível à postura de um chefe do Poder Executivo tentar “resolver” o impasse colocando o povo na linha de frente das “negociações”. O que seria uma tentativa de fazer pressão ao parlamento utilizando bolsonaristas como massa de manobra. Essa estratégia não se configuraria, também, uma forma de chantagem ao Congresso?

Governo a reboque do Congresso e do STF

Ciente do deslize cometido, Bolsonaro tentou consertar mais esse estrago. Pediu aos membros de sua equipe de governo para não endossarem publicamente qualquer apoio ao ato do próximo dia 15 de março. A fim de evitar maiores animosidades e azedar ainda mais as relações com o Congresso. De agora em diante, o jeito é tentar se explicar com Alcolumbre, Maia e Toffoli, como já foi aconselhado o presidente. Do contrário, teremos mais um ano em que o Planalto conduzirá o governo a reboque do Congresso e do STF, sem as mínimas condições de protagonismo na aprovação de projetos. E diante de qualquer outro deslize um pouco mais grave, a abertura de um processo de impeachment não estará descartada. No mínimo, governar na corda-bamba deverá ser a tônica até o fim do mandato, infelizmente.

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