Uso do plástico não deve ser “demonizado”, mas, sim, incentivar-se a separação do lixo

Uso do plástico não deve ser “demonizado”, mas, sim, incentivar-se a separação do lixo

Vanessa Martins de Souza

O prefeito de São Paulo, Bruno Covas, sancionou no último dia 13 uma lei que proíbe o fornecimento de copos, pratos e talheres de plásticos na cidade. Com a proibição, os itens devem não só deixar de ser oferecidos por bares e restaurantes como também não estarão mais disponíveis no comércio e em supermercados para uso doméstico. A legislação entra em vigor em 1º de janeiro de 2021. Ainda neste mês, a Prefeitura deve regulamentar lei aprovada em junho do ano passado que proíbe o uso de canudos plásticos na capital paulista. A Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) também aprovou legislação semelhante abrangendo todo o estado. A proposta é que os itens de plástico sejam substituídos por material biodegradável ou reutilizáveis, pois, 16% do lixo gerado na capital é composto pelo plástico em suas variadas formas.

Campanhas educativas

Os defensores da iniciativa alegam que a legislação está contribuindo para modificar a cultura da população, tornando-a mais atenta a evitar o acúmulo de lixo a base de plástico. Porém, o problema não é o uso do plástico em si mesmo e o acúmulo desse tipo de lixo reciclável, mas, o descarte incorreto, ou seja, a falta de separação desses materiais, que deveriam ser 100% destinados ao lixo reciclável. Em outras palavras, o que precisa ficar claro à população é que o lixo formado por materiais plásticos não tem vontade própria e não caminha sozinho a locais incorretos, a exemplo de encontrar-se misturado ao lixo orgânico, jogado em meio às vias públicas, à vegetação, nas praias, rios e mares. Se ele tão frequentemente é encontrado em locais indevidos, poluindo gravemente o meio ambiente, é tão somente porque pessoas jogaram-no lá. Então, por que não educar as pessoas, conscientizar a sociedade, da urgência da separação do lixo orgânico do reciclável, promovendo-se campanhas assertivas, consistentes e persistentes sobre a importância da reciclagem? Mas, parece mais fácil e rápido criar legislações que visem banir e até “demonizar” o uso do plástico… Jogar lixo de plástico biodegradável nos mares, nos rios, nas matas será a solução, apenas por uma diminuição do impacto ambiental? O plástico biodegradável não deixa de ter certo potencial poluente.

Impacto econômico

Se toda a população estivesse habituada à separação criteriosa do lixo e a indústria preparada para efetuar uma parceria com a sociedade no incentivo e apoio à reciclagem não haveria motivos para a “demonização” do plástico. Inclusive, a Associação Brasileira da Indústria do Plástico (Abiplast) disse que as proibições aos produtos “trazem insegurança jurídica, mexem com a competitividade e o planejamento financeiro das empresas, causando impacto nos investimentos, na geração de empregos e até mesmo na manutenção da atividade industrial”. A representante da indústria de plástico defende que, em vez de proibir o uso desses produtos, este deve ser regulamentado de forma a reduzir o consumo e garantir a reciclagem. A indústria de transformação e reciclagem de material plástico está disposta a contribuir para a construção de soluções em conjunto”, disse o comunicado da associação.

Descaso da população

Enfim, mais uma vez, governantes estão olhando para o lado errado do problema. O plástico ainda é altamente necessário à indústria. Obviamente, não se deve descartar a pesquisa e o investimento em materiais menos poluentes. Mas a única grande questão é a falta de educação cidadã e de preocupação da população com o cuidado ao meio ambiente. Se a indústria nacional for cerceada por interesses pseudo-ambientalistas, milhões ficarão desempregados. E o que é pior: estes empregos migrarão a outros países. É fácil perceber a ignorância, o desprezo e a indiferença dos frequentadores das praias e ruas brasileiras. A cada dia, toneladas de resíduos recicláveis são coletados e, no outro dia, também.

Força-tarefa a nível nacional

O ideal seria lançar campanhas massivas, a nível nacional, em parceria com estados e municípios, unindo forças em torno de um objetivo comum. Na última virada do ano, foi flagrante o descaso da população e do poder público em diversas localidades brasileiras, quando se viu nas redes sociais fotografias de diversas praias, e locais como o Parque Barigüi, em Curitiba, repletos de lixo após a festa de Ano-Novo. Além de campanhas, a possibilidade de cobrança de multa a quem for flagrado jogando lixo em local errado deve ser cogitada. Se o povo não educar-se por bem, terá de ser educado por mal. Se doer no bolso, certamente um novo comportamento é obrigado a ser criado. Essa questão da destinação e separação correta do lixo deve ser permanentemente discutida e incentivada nas escolas, igrejas, estádios, grandes e pequenos eventos públicos.

Parcerias com a iniciativa privada

Não custa aos organizadores apelarem aos participantes de qualquer ato público para que colaborem jogando os resíduos no lugar certo e separado. Para isso, deve haver uma força-tarefa entre poder público e iniciativa privada a fim de proporcionar os meios de descarte e coleta separados. Assim, empregos e o desenvolvimento econômico estarão garantidos, criando-se um círculo virtuoso de progresso e bem-estar. Inclusive, garantindo a fonte de renda dos recicladores, os chamados “catadores de papel”, que sustentam suas famílias a partir dessa atividade e impulsionam a indústria da reciclagem. Há certos estabelecimentos comerciais que ficarão em apuros sem a oferta de copos, pratos e talheres de plástico, a exemplo de vendedores ambulantes. Quem poderá contratar funcionários para lavar louça reutilizável, por exemplo, sendo que esse custo terá de ser repassado ao consumidor?

Exemplo da Alemanha

Na Alemanha, a separação do lixo – chamada “Mülltrennung” – é tão meticulosa que há tonéis, contêineres, diferentes para cada tipo de material reciclável, a exemplo de garrafas de vidro, plástico, embalagens de leite, metais e papéis. Reciclar o lixo na Alemanha é lei e foi regulamentado já em 1972, mas as primeiras leis surgiram já no século 19. E a legislação prevê multas individuais e coletivas (em condomínios residenciais e empresas) a quem não faz a correta separação do lixo. Precisamos seguir exemplos como o da Alemanha, onde o povo e governantes são “obsessivos” por reciclagem de lixo, constituindo-se numa tradição cultural de limpeza e ordem. Um sonho muito ambicioso para um país de cultura tão diferente como a do Brasil? Talvez. Mas, é preciso dar o primeiro passo.

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