quinta-feira, 28 de março de 2024
Digitalização e humanidade

Digitalização e humanidade

por Emanuel Santana

Como olhar para o futuro e ver um mundo que ainda não existe? Não há tecnologia que possa fazer esse trabalho. Em novembro de 2017 a revista científica Nature publicou uma pesquisa revelando que o cérebro humano é capaz de olhar o futuro de fato. Obviamente, é bem mais fácil olhar segundos à frente no tempo, do que décadas.

A clareza com a qual se enxergará o futuro dependerá da liberdade concedida aos sentidos, percepção e imaginação. O ponto de partida também irá influenciar aonde se poderá chegar. No contexto da revolução tecnológica digital é preciso ter em mente dois princípios:

O digital não é fruto do humano e sim a sua essência. Entender o digital como a semente da vida, considerar que o DNA é essencialmente um código de informações que programam e coordenam o desenvolvimento e funcionamento de todos os seres vivos.

A conexão entre homem, tecnologia e natureza. Nessa nova trindade, a tecnologia é o meio pelo qual os homens dominam a natureza da qual também fazem parte.

Heróis e vilões: Homens e máquinas

Há dez anos homens e máquinas salvaram a vida do meu filho do meio, Tiago, e continuam salvando todos os dias, desde que ele nasceu. Tiago tem uma síndrome rara, Síndrome de Ondine, que faz com que ele não sinta falta de ar, nem tenha o controle autonômico da respiração. Todas as noites ele precisa de uma máquina para respirar e de um humano para velar seu sono. Minha experiência nesta última década evidencia que a discussão central do futuro não é homem versus máquina, mas sim homem mais máquina e homem versus próprio homem.

A singularidade tecnológica, homem mais máquina, seria um processo em curso iniciado há cerca de 3 milhões de anos. Bem anterior às transformações digitais da tecnologia, o osso, o fogo, as ferramentas de pedra, a agricultura, a roda e tantas outras ferramentas que modificaram a maneira como o homem se relacionava com a natureza e ao mesmo tempo, modificaram o próprio ser humano profundamente. Poder consumir mais proteínas foi fundamental para o desenvolvimento do seu cérebro e, por consequência, para o desenvolvimento da escrita, registrando e amplificando o pensamento para além do encéfalo.

Do registro à produção, distribuição e consumo em escala global, o livro, com o tipo móvel de Gutenberg, possibilitou escalar a educação para o mundo, modelando as pessoas para o emprego na Revolução Industrial. Quando as palavras já não eram suficientes, foi preciso escrever com a luz, fotografar, dominar o som e imagem para compartilhar a vida em um mundo digital onde o ser humano novamente passou a se reinventar.

O futuro entre desejos e medos

Se na lei de Moore, a capacidade de processamento dos computadores dobrava a cada 18 meses com os mesmos custos, muito mais veloz é a multiplicação do desejo humano, a despeito de seus custos. Agora que já se decifrou o código da vida, o homem quer reescrevê-lo à sua vontade, retardar o envelhecimento com a nanotecnologia molecular e engenharia genética, substituir continuamente componentes defeituosos do corpo para uma possibilidade de vida ilimitada ou mesmo carregar a consciência pós-morte em uma supermáquina.

Em oposição à perspectiva da abundância está o temor do homem de que a criação de uma superinteligência artificial, com níveis superiores a toda inteligência humana, possa substituí-lo ou até mesmo eliminá-lo.

Provavelmente, nenhuma das duas previsões acontecerá de fato. Quem tiver sorte experimentará um futuro resultante das forças desses opostos e terá que reaprender constantemente em um mundo que desafiará cada vez mais a inteligência humana e colocará em xeque suas crenças com muito mais frequência.

Relembrando, este processo começou há pelo menos 3 milhões de anos e é, obviamente, irreversível. A novidade é que o mundo está no limiar de uma nova revolução, já experimentando mudanças radicais no modo de vida que irão se aprofundar ainda mais.

Emanuel Santana
Publicitário, mestre em educação, diretor do Sistema de Ensino e Inovação da rede CNEC e diretor de comunicação da AbraCCHS – Associação Brasileira das Famílias, Amigos e Pessoas com CCHS – Síndrome de Ondine.

publicidade

Compartilhe:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

plugins premium WordPress